Na espuma dos dias

O TRIPÁLIO DOS FUTEBOLISTAS DO S. C. DE CABINDA: HAJA CONSCIÊNCIA!

Tenho um especial carinho pelo Sporting Clube de Cabinda, pois faz-me recordar a final do Campeonato de Angola de Juniores, em 1975, em que fui campeão pelo Lusitano Sport Clube, do Lobito, por isso, mas não só por isso, fico triste e desassossegado com as notícias que nos chegam sobre o (des)tratamento a que sujeitam os Leões do Mayombe.

Por: Édio Martins
(edio.martins@netcabo.pt)

Os atletas, que não quiseram ver as suas identidades reveladas, por medo de alegadas represálias, declararam  que “…a equipa realiza jogos em condições desumanas, sem comida, sem transporte e sem condições adequadas para dormir, sendo que o pão com manteiga e chá tem sido a comida que a direcção do clube tem colocado à disposição dos jogadores” e um dirigente do Clube, responsável para o futebol, admitiu que os atletas e equipa técnica estão há largos meses sem salários, sem, no entanto, revelar o tempo exacto.

O que temos aqui é a “obrigação de trabalhar”, na sua forma mais grotesca e medieval: o tripálio!

Tripálio (do latim tardio “tri” (três) e “palus” (pau); literalmente, “três paus”) é um instrumento romano de tortura, no qual eram supliciados os escravos. Daí derivou-se o verbo do latim vulgar tripaliare (ou trepaliare), que significava, inicialmente, torturar alguém no tripálio.

Por sua vez, a palavra trabalho (e é de trabalho que falamos…) vem do latim tripalium, termo utilizado para designar instrumento de tortura, ou mais precisamente, “instrumento feito de três paus aguçados, algumas vezes ainda munidos de pontas de ferro, nas quais agricultores bateriam o trigo, as espigas de milho, o linho, para rasgá-los e esfiapá-los”. A maioria dos dicionários, contudo, regista tripálio apenas como instrumento de tortura, o que teria sido originalmente, ou se tornado depois.

Por muito tempo o significado de trabalho foi associado a fardo e sacrifício. Na Grécia Antiga, o trabalho era desprezado pelos cidadãos livres. Platão considerava o exercício das profissões vil e degradante. Nos primeiros tempos do cristianismo, o trabalho era visto como tarefa penosa e humilhante, como punição para o pecado. Ao ser condenado, Adão teve por expiação trabalhar para ganhar o pão com o suor do seu próprio rosto.

Essa concepção, aqui sumariamente apresentada, permaneceu por mais de 14 séculos. Só com o Renascimento (XIV – XVII), o trabalho ganhou uma outra concepção – fonte de realização humana e também de identidade, chegando-se, aliás, ao surgimento de filosofias de dignificação do trabalho como actividade passível de dar prazer, adequando-se por completo às doutrinas calvinistas.

O trabalho reduzido ao arcaico conceito de tripalio, trazido para os tempos de hoje, atenta contra a dignidade da pessoal humana – devidamente inscrita na Constituição da República, desqualifica as instituições, expõe as fragilidades do Estado protector (onde pára?) e, acima de tudo, deve questionar-nos a TODOS! Pela natureza da actividade importa também ressaltar a ligeireza com que tudo é feito e a destruição completa da “verdade desportiva”…

Onde se espera exemplos de boas práticas sociais, que sempre influenciam as gerações mais jovens, entretenimento, desporto… o que temos? Indignidade e tortura! Alguém quer escrever uma nova lógica “o trabalho danifica o homem”. Entendi tudo agora. Estamos juntos!

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