Autor de vários sucessos no estilo de música tradicional, Baló Januário tem privilegiado temas sociais sobre o quotidiano, com base em trabalhos de investigação em zonas rurais, particularmente, como na região da Quiçama, em Luanda. O cantor, que mereceu várias distinções ao longo de mais de duas décadas de carreira, fala, em exclusivo, sobre a carreira, projectos e o dia-a-dia.
Textos: Venceslau Mateus
Fotos: Arquivo NET
Figuras&Negócios (F&N) – Autor de vários sucessos do mercado musical angolano, Baló Januário é uma referência no que à música folclórica diz respeito. A que se deve este sucesso?
Baló Januário (BJ) – Não é por acaso. É preciso trabalhar duro, juntar à nossa vocação, o dom, trabalho e profissionalismo para se conseguir alcançar o sucesso que se pretende. É assim em todas as profissões. Não adianta achar que és bom, mas descuras os principais aspectos para atingir os objectivos preconizados.
F&N- Apareceu no mercado de “caxexe”, com a música “Maka Ndumba o kiosso kiwabindama” em 1998.
BJ – O tema “Maka Ndumba o kiosso kiwabindama” tornou-se a minha porta de entrada no mundo da música. Por causa deste tema, digamos, em abono da verdade, um grande sucesso na altura, recebi, em 2002, um convite para participar no projecto “Vozes” com músicos como malogrado Nike, Rey Leão, Revalito Day Doy Tity Matias, entre outros. Depois disto surgiram “Azar da Belita”, em 2009, e “Boca na Botija”, em 2010.
F&N- Mais de 10 anos tendo a música folclórica como referência, que balanço faz da sua carreira?
BJ– A música folclórica é minha cultura é a cultura do meu povo da Quiçama.
Propôs-me a elevar a katutula, cabecinha e o sambalage para o mais longe possível para deixar de ser vista apenas como dança dos óbitos. A verdade é que estou muito satisfeito com os resultados alcançados até hoje. Felizmente, tornaram-se em ritmos bastante ouvidos e dançados, sinal de que consegui alcançar o propósito a que me propus desde o início desta aventura.
F&N- Valeu apenas a aposta na música folclórica? Porquê?
BJ– Sinceramente falando nem fazia ideia do que estava por vir. Tudo foi feito apenas por amor à música. Quando fazemos as coisas com amor, os resultados são sempre muito satisfatórios. Pelo que consegui até hoje, posso dizer, sem medo, que valeu apenas a aposta. Se tivesse que repetir o faria sem problemas nenhum. É verdade que posso fazer outros ritmos, mas é na música folclórica que me sinto bem. E vou continuar a apostar na música folclórica.
F&N-A música folclórica ou tradicional tem futuro no mercado angolano? Porquê?
BJ– Tem futuro sim. As grandes dificuldades são conjunturais, a falta de mercado, principalmente associado ao facto dos direitos autorais não funcionarem, ou seja, ninguém paga ninguém, não impede que haja futuro neste segmento musical. O futuro depende como vamos passar a mensagem às novas gerações.
F&N- Os músicos angolanos têm uma legião de seguidores que fazem ou imitam tudo o que fazem. Até que ponto estão, os músicos angolanos, preparados para ajudar na edificação de uma sociedade sã?
BJ– Mesmo nos momentos difíceis, durante a luta de libertação nacional, os músicos angolanos sempre tiveram um papel preponderante na edificação e preservação da nossa identidade cultural. Portanto, estamos preparados e sempre disponíveis para ajudar no que é possível e dentro das nossas limitações.
F&N- Acredita que os músicos têm sido bons exemplos para a construção de uma sociedade moralmente saudável?
BJ– É como tudo, em todas áreas do saber ou profissões, vamos encontrar bons e eventualmente, maus. Mas, de uma forma geral, temos contribuído positivamente para que Angola se torne num lugar óptimo para se viver. É obrigação de cada angolano dar o melhor de si em prol da afirmação do país no concerto das nações.
F&N-Onde vai buscar inspiração para o trabalho que apresenta ao público?
BJ– Quando era pequeno a minha fonte de inspiração era a minha mãe, mas agora o público acaba por ser a maior fonte de inspiração. o dia-a-dia dos angolanos tem sido o principal recurso para composição das músicas colocadas ao dispor do público. Não há melhor fonte de inspiração para um criador do que “as malambas” sociais. Em tudo quanto é canto de cada uma das cidades em Angola encontramos motivos para cantar.
Por exemplo, a música “Azar da Belita” narra uma história pessoal. É um acontecimento real que envolveu a minha família, particularmente a minha mãe.
F&N-Como olha para o mercado musical em Angola?
BJ – Do ponto de vista musical nunca tivemos um mercado bom, eu diria no geral. Não vejo um artista que vendeu 100 mil cópias, não existe, mesmo os grandes cantores que nós temos. Os grandes cantores são Matias Damásio, Anselmo e eventualmente Nagrelha, mas ninguém vendeu 100 mil cópias ou 200 mil. Então se tu tens artistas que nunca venderam 100 mil cópias, à partida não existe mercado onde os artistas podem sentir-se realizados.
Não sei se estamos a progredir ou regredir, é complicado chegar-se a uma conclusão. A evolução das novas tecnologias deram também origem a um tipo de venda que ainda não é comum aqui. As vendas online, a gente ouve falar, mas na prática não acontece. É melhor dizer que não temos.
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