Por: Édio Martins
(edio.martins@netcabo.pt)
Para que ajustemos a mira, entendemos a corrupção como um espaço de vícios onde o poder do interesse público, vincula sobre os interesses privados e cuja acção põe em causa as finalidades últimas do Estado democrático e de direito!
É notório (e é triste) o efeito da corrupção em Angola! Basta “andar por aí” que logo reforçamos a nossa percepção sobre o impacto da corrupção na efectivação dos direitos sociais, na medida em que se recebe menos serviços sociais, tais como, educação e saúde, aumentando a mortalidade infantil e reduzindo a expectativa de vida, funcionando assim como uma espécie de imposto, já que, famílias pobres gastam três vezes mais para terem acesso aos serviços sociais do que famílias com poder aquisitivo mais alto.
O fenómeno da corrupção, pela sua característica, é próprio de espaço de silêncio e poder, os instrumentos de combate não podem redundar em meras declarações e em sucessivas propostas de reflexão… É um bom exemplo disso o que podemos retirar da Estratégia Nacional de Prevenção e Repressão da Corrupção (ENAPREC) 2024-2027, aprovada em decreto presidencial de 19 de Julho: …as autoridades devem promover uma “reflexão profunda sobre o regime de declaração de bens com vista à sua eventual alteração”; ou “a promoção na academia e nas instituições especializadas, de estudos periódicos sobre os níveis de percepção da corrupção no país, visando identificar as áreas mais propensas”;
Atentemos no regime de declaração de bens: a lei angolana da probidade, aprovada em 2010, estabelece que titulares de cargos políticos providos por eleição ou nomeação, magistrados judiciais e do Ministério Público, sem excepção, e gestores e responsáveis da administração central e local do Estado estão sujeitos à declaração de bens.
Pasme-se! Esta declaração é apresentada em envelope fechado e lacrado, à Procuradoria-Geral da República. No maior dos secretismos, sem transparência, logo sem qualquer escrutínio público, seja dos media seja de entidades da sociedade civil, ou seja, tudo acontecendo nas costas do povo, contrariando a Constituição da República onde está plasmado no Artigo 3.º (Soberania) e no seu ponto “1. A soberania, una e indivisível, pertence ao povo…” e no Artigo 2.º (Estado Democrático de Direito) ponto “1. A República de Angola é um Estado Democrático de Direito que tem como fundamentos a soberania popular…”.
Em vez de uma “verificação” de pares inter pares, devia ser estabelecido, mediante protocolo próprio, um regime de declaração de bens aberto, o que permitiria a sua verificação/escrutínio periódico.
Tudo simples, nada fácil. Porquê? Na mente de cada um de nós a resposta é óbvia.
É sempre hora de mudar, de virar a página e se reinventar (mesmo que doa, aprender não é um processo em vão). São urgentes a implementação de instrumentos cujo combate seja mais eficaz ao crime ou em alterações sociológicas profundas.
A cultura do bem-estar sem esforço ou mérito, não pode continuar a ser o desiderato primordial da nação. Ser honesto é sinónimo de inutilidade, de desventura ou de burrice?
A corrupção deve ser vista como uma patologia de profunda fragilidade institucional, e não como uma determinante básica ou ímpar dos males da sociedade.
Este é um compromisso de todos, Estado e Sociedade, e o êxito da sua concretização pressupõe a superação das posturas maniqueístas e fundamentalistas, bem como do tão difundido jogo de empurra-empurra, que assola o Estado democrático de direito angolano. Estamos juntos!
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