Por Vítor Norinha
Alemanha foi a eleições e a CDU, equivalente aos sociais-democratas portugueses, ganhou as eleições com 28,5% dos lugares no parlamento alemão. A ultra-direita AfD ficou em segundo lugar e foi o resultado mais espetacular. O SPD do anterior chanceler alemão, equivalente ao Partido Socialista português, ficou em terceiro lugar. Aquilo que os analistas perspetivam é uma grande coligação entre sociais-democratas e socialistas para formar rapidamente um Governo que se vai centrar na recuperação da economia alemã, que desde há dois que apresenta sinais de estagnação.
A coligação mais viável, entre a CDU de Friedrich Merz, o novo chanceler, e o SPD de Sholtz, o anterior chanceler, é aquela que aparenta ser a mais positiva para euro, como para as empresas alemãs que estão no índice bolsista DAX. Salienta a corretora de Valores, XTB, que o principal índice da Bolsa de Valores alemã, em Frankfurt, arrancou de forma positiva depois de se saber o resultado eleitoral, e o euro deu sinais de recuperação em face do US dólar. Refere a gestora Allianz Global Investors que as empresas do índice alemão DAZ geram, em média, 20% das suas vendas na Alemanha e que, por isso, “uma constelação governamental favorável às empresas deverá garantir melhores fatores de localização a médio prazo e iniciar uma recuperação da procura interna.”
A indústria alemã é intensiva no uso de energia, o que leva as empresas a exigir custos de energia competitivos. A par desse aspeto, a Alemanha precisa de mais investimentos na Defesa, sendo que foi o país europeu que mais ajudou a Ucrânia em termos de armamento e formação. O partido vencedor também prometeu mais investimento na educação e posterior transferência de conhecimento para a economia, a par de um ambiente mais atrativo para as startups.
O que esperava quando escrevíamos este texto era de que a Alemanha conseguisse fazer a “grande coligação” entre os dois partidos do “arco da governação”, algo que aconteceu no período em que a CDU foi liderada por Angela Merkel, sendo que o grande problema no investimento público será o travão à dívida pública estatuído na Constituição e cuja revogação obriga a uma maioria qualificada de dois terços dos deputados, algo que nas atuais condições parece pouco provável. O novo chanceler alemão fez campanha por um programa favorável às empresas, com impostos mais baixos, menos regulamentação e menos benefícios sociais. Ambos os partidos, CDU e SPD, pretendem incentivar os investimentos em infraestruturas, o que irá beneficiar as empresas de construção civil, e as companhias de energia e as empresas ligadas a infraestruturas, sendo que ambos os partidos apoiam medidas de incentivo às energias renováveis.
A expetativa que também poderá beneficiar os mercados financeiros é tudo o que estivar ligado a liderança da União Europeia, uma região que precisa urgentemente de uma nova arquitetura de segurança, apar da definição do posicionamento relativamente China enquanto parceiro comercial.
Os analistas acreditam que haverá boas perspetivas para as pequenas e médias empresas com a eventual redução da burocracia, que também beneficiarão de uma maior procura interna. Vão ainda beneficiar as empresas das áreas de infraestruturas digitais e energéticas e bens de equipamento em geral.
Impacto nos mercados
O início de 2025 levou analistas dos mercados financeiros a alterarem as perspetivas. A visão de Johanna Kyrklung, Group Chief Investment Officer, da gestora de fundos inglesa Schroders, é algo diferente do que pensava em meados de 2024, quando afirmava que o crescimento nominal positivo e os cortes nas taxas de juro eram favoráveis aos mercados acionistas. Hoje fala em dois riscos: o primeiro refere-se ao retorno das obrigações que poderá prejudicar as ações, e outro é a elevada concentração dos índices de ações. Começa por fazer a história das políticas públicas da década de 2010 quando havia políticas fiscais restritivas e taxas de juro zero. O sistema acabou por conduzir a um agravamento das desigualdades de rendimentos e a uma perceção de que o cidadão médio no ocidente não estava a beneficiar proporcionalmente do crescimento económico. Assistiu-se a um apoio político a ideias populistas e a um novo consenso que favorece políticas fiscais expansionistas, protecionismo e taxas de juro mais elevadas. Acontece que políticas fiscais mais expansionistas implicam um aumento do endividamento e, em muitas regiões constata-se um fenómeno altamente preocupante com o envelhecimento da população e a necessidade de aumentar despesas em outras áreas como seja na Defesa. Tudo leva a níveis mais elevados de dívida pública, o que, em última análise, será um fator limitante dos retornos do mercado. Alerta a Schroders que “o aumento da despesa pública tem sustentado as economias, mas poderá estar a criar excessos que, normalmente, seriam corrigidos por uma recessão.” Adianta a mesma analista que valores das ações “podem ser sustentáveis enquanto as yields das obrigações não subirem demasiado”. Ora quando se assiste a uma taxa de rendibilidade das obrigações do Tesouro dos EUA a 10 anos a rondar os 4,8%, começamos a entrar numa zona vermelha para a valorização das ações relativamente aos rendimentos obrigacionistas. E isto porque yields mais elevadas podem desviar capital do mercado de ações e, em paralelo, fazem aumentar o custo das empresas.
Por outro lado, a nível de concentração dos índices de ações há aqui um paralelo com a bolha das “dotcom” que aconteceu no final dos anos 90 do século passado, sendo que na altura as valorizações eram impossíveis de justificar. Na atualidade, diz a mesma fonte, as grandes tecnológicas norte-americanas estão a gerar lucros que justificam as suas valorizações, mas qualquer acontecimento externo que altere o contexto do negócio, pode comprometer os retornos com impacto global nos mercados financeiros. A Schroders aconselha à construção de carteiras de títulos mais resilientes.
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