Dossier

Angola vinte anos de paz

Escrito por figurasnegocios

DIA 4 DE ABRIL DE 2002: INESQUECÍVEL E DETERMINANTE PARA A VIDA DE TODOS!

Texto: Carlos Miranda* / Fotos: Arquivo
Este ano, o país inteiro comemorou vinte anos de paz; uma paz que até ser conquistada aos 4 de Abril de 2002, resultou em centenas de milhares de mortos e feridos, deslocados de guerra e a busca incessante do exílio de uma importante geração de jovens angolanos. No chão, que devia ser cultivado para saciar a fome dos milhões dependentes da caridade internacional, foram plantadas minas que mataram e mutilaram outras milhares de vítimas inocentes.O ambiente político-militar era demasiado negro para as ambições de uma população sedenta de liberdade, mas foram os próprios militares de ambos os lados do conflito que abraçaram os ideais de paz. Aconteceu há vinte anos…

Também eles,os militares, fartos de tanta incompreensão, desconfiança e da hipocrisia dos políticos, decidiram inverter o curso da história.Assim,foi rubricado o Memorando de Entedimento no Luena (Moxico) e finalmente foi possível que se assinassem, em Luanda, os Acordos de Paz pelas chefias militares das Forças do Governo (Forças Armadas Angolanas- FAA) e da Unita (Forças Armadas de Libertação de Angola-FALA), designadamente Armando da Cruz Neto e Geraldo Muengo ” Kamorteiro”.

O país vivia ainda um clima de incerteza face ao futuro daqueles que deviam ser incorporados no exército governamental, num trabalho árduo que, passados 20 anos de paz, e removidos quase todos os obstáculos, sobretudo financeiros, pode ser considerado um exemplo para a África, onde reinam conflitos militares de extrema complexidade,impedindo a vontade expressa das populações em alcançar um clima de concórdia , de paz e de reconciliação nacional.

O na altura Presidente da República, José Eduardo dos Santos, seria considerado o protagonista decisivo para o desfecho de uma guerra hoje ainda não totalmente esquecida. Com a assinatura dos Acordos de Paz de Abril de 2002, um capítulo determinante da história dos acordos de paz até então rubricados fechar-se-ia – com o consentimento e aplauso da comunidade internacional – um ciclo violento de incompreensões entre irmãos da mesma terra. Iniciou-se um novo ciclo de confiança no futuro de um país disposto a encarar a reconstrução e a reconciliação nacional a partir de um modelo político estratégico de convivência delineado pelos seus próprios filhos.

Vale a pena recordar, de novo, a história. Antes de se ter rubricado o Memorando de Entendimento, assinaram-se os Acordos do Luena (Moxico), sempre com o compromisso de se alcançar a paz, enquanto tentava-se a todo o custo fazer com que a reconciliação nacional fosse um facto em todo o país e se idealizassem passos tímidos para a reconstrução de vilas, aldeias, municípios e cidades, para além do estabelecimento de condições propícias à realização das segundas eleições gerais em Angola.

Lançou-se um desafio nos Acordos do Luena: “Os dois lados prometem pôr fim às hostilidades e restabelecer a paz em todo o território angolano”, concordando ao mesmo tempo que “o acto irá restabelecer a paz definitiva em Angola”.A promessa dos militares ocorreu exactamente um mês depois da morte do líder da Unita, Jonas Savimbi, com o exército e as forças de segurança do governo a assegurar que já não haveriam condições para o retorno à guerra.(*Actualizado)

Até ao calar das armas
PERCURSO POLÍTICO DRAMÁTICO

Foi longo o percurso da luta pela conquista de um entendimento entre os políticos e militares nas mais diversas frentes em que se envolveram numa guerra durante vinte e sete anos,até que se chegasse ao histórico dia 4 de Abril de 2002- o dia da paz.Eis, alguns momentos:

1954 – Fundação do PLUA – Partido da Luta dos Africanos de Angola.

1956 – Do PLUA emergiu o MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola, sob a presidência de Agostinho Neto.

1956 – Um manifesto do MPLA circula pelas ruas de Luanda a denunciar a opressão colonialista.

1958 – O MIA – Movimento de Independência de Angola – une forças com o MPLA.

1975 – 11 Novembro – O Presidente Agostinho Neto proclama em Luanda a independência de Angola.

1976 – 27 Março – Retirada das tropas sul-africanas que, a partir da Namíbia, haviam lançado em Outubro, a “Operação Savannah”, contra o território angolano.

1977 – 27 Maio – Tentativa frustrada de um Golpe de Estado, conduzido por Nilo Alves e outros dissidentes do MPLA.

1979 – 10 Setembro – Morre em Moscovo, vítima de doença, o Dr. Agostinho Neto, primeiro Presidente de Angola. José Eduardo dos Santos é proclamado o novo Presidente da República no dia 21 de Setembro.

1981 – Agosto – Quinze mil soldados sul-africanos, apoiados por blindados e aviação de combate, invadem Angola, bombardeando a província da Huíla e ocupando parte da província do Cunene, na operação designada por “Prothea”.

1983 – Setembro – As Forças Armadas angolanas desencadeiam a “Operação Berlim” para impedir a abertura da intitulada “segunda fase estratégica” da UNITA, na região do Mussende no Kwanza-Sul.

1984 – 25 Março – A UNITA ataca a cidade do Sumbe, capital do Kwanza-Sul.

17 Novembro – O Presidente angolano apresenta uma “Plataforma da Paz” numa carta dirigida a Javier Perez de Cuellar, secretário-geral da ONU, onde requer a retirada imediata e incondicional das forças sul-africanas e a cessação das agressões contra Angola, e a cessação de todo o apoio à UNITA a partir do exterior.

1986 – Janeiro – O Líder da UNITA, Jonas Savimbi, é recebido na Casa Branca pelo Presidente Ronald Reagan.

1987 – Setembro – Tropas sul-africanas invadem o sudoeste angolano para contrariar a ofensiva governamental contra a UNITA.

1988 – Janeiro – Forças sul-africanas atacam as posições angolano-cubanas a Leste do Kuíto Cuanavale, no Kuando-Kubango, com tanques, carros blindados e aviões de combate.

11 de Maio – Realização da Primeira Reunião Quadripartida entre delegações de Angola, Cuba, África do Sul e EUA em Londres, com vista à resolução do Processo de Paz em Angola e da independência da Namíbia.

Julho – Em Nova Iorque e Genebra realizam-se a 4ª e 5ª Reunião Quadripartida, onde se alcança um acordo sobre um conjunto de princípios e anuncia-se um cessar-fogo provisório.

1989 – 22 Junho – Um Plano de Paz é estabelecido entre o Presidente angolano e o líder da UNITA em Gbadolite, no Zaire. Cinco dias depois o Governo denuncia a violação, por parte da UNITA, do acordo de cessar-fogo e Jonas Savimbi desmente ter aceite o seu afastamento da cena política.

1990 – Face à falha do acordo de Gbadolite, Angola prescinde da mediação zairense e opta pela portuguesa. Várias reuniões realizam-se em Portugal entre delegações do Governo e da UNITA, sem quaisquer resultados. Portugal defende a participação futura de observadores norte-americanos e soviéticos.

1991 – 31 Maio – É assinado em Bicesse, Portugal, um Acordo de Paz entre o Presidente angolano e o Líder da UNITA, que prevê o cessar-fogo e normas de convivência entre as partes, nomeadamente a constituição de um exército único e a marcação de eleições multipartidárias. As Nações Unidas, através da UNAVEM-II, fiscalizarão o cumprimento do cessar-fogo no país.

1992 – 29/30 Setembro – Primeiras eleições gerais multipartidárias, presidenciais e legislativas, na História do País. O Presidente José Eduardo dos Santos vence a primeira volta das presidenciais com 49,57% dos votos e o MPLA obtém a maioria absoluta nas legislativas com 53,74% dos votos.

1993 – 7 Março – A UNITA ocupa militarmente o Huambo, a segunda cidade do país. Cinco dias depois, o Conselho de Segurança da ONU aprova mais uma resolução que condena “as persistentes violações pela UNITA das principais provisões do Acordo de Paz”, por se ter retirado das novas Forças Armadas e não ter participado nas instituições políticas saídas das eleições.

1994 – Novembro – As Forças Armadas Angolanas (FAA) retomam as cidades do Huambo e Uíge. No dia 20, o Governo e a UNITA assinam formalmente o Protocolo de Lusaka, que assinala “supostamente” o fim das hostilidades no País.

1995 – 9 Dezembro – Em Washington, o Presidente de Angola reitera o seu total empenho no processo de reconciliação nacional e no programa de reformas económicas do Governo.

1996 – Setembro – O III Congresso da UNITA rejeita a indicação de Savimbi para ser um dos vice-presidentes. O MPLA recomenda ao Governo que declare a caducidade da cláusula do Protocolo de Lusaka que conferia ao líder da UNITA um “estatuto especial”.

1998 – 9 Dezembro – A UNITA anuncia que está a organizar as suas forças para reatar a guerra. Dias depois, forças militares cercam as cidades do Huambo e Kuíto. O Conselho de Segurança da ONU deplora a “grave deterioração da situação em Angola” e atribui a responsabilidade a Jonas Savimbi.

1999 – Janeiro – A UNITA inicia um ataque à cidade de Malanje. O Secretário-Geral da ONU propõe em Washington o fim das operações da ONU em Angola.

Agosto – O Presidente Angolano anuncia em Maputo que o seu Governo não voltará a negociar com Jonas Savimbi.

2000 – Fevereiro – O Presidente de Angola denuncia que a UNITA, derrotada na guerra convencional, procura agora bases de apoio no interior e no exterior para passar à guerra de guerrilha.

2000 – 11 Novembro – Numa mensagem à Nação, por ocasião do 25º Aniversário da Independência nacional, o Presidente José Eduardo dos Santos anunciou uma larga amnistia para todos os que abandonem a guerra e optem pela Democracia, para iniciar os preparativos das próximas eleições presidenciais e legislativas. Garantiu que o Governo continua empenhado em vencer a crise económica e social .

2002 – Jonas Savimbi é morto em Fevereiro de 2002. É assinado um Acordo de Paz entre a UNITA e o Governo de Angola, em Abril.

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