Introdução – O Caminho-de-ferro de Benguela (CFB) foi fundado em 1899, por Robert Williams – ainda que o CFB tenha começado a ser operacional em 1905 –, aproveitando a fundação do porto da minha bela cidade do Lobito e sob a visão imperialista do britânico Cecil John B. Rodhes, de que Williams era um colaborador, que desejava fazer circular as suas actividades mineiras pelos principais portos afro-austrais e, todo o cobre da África Central (da área mineira congolesa do Katanga (Shaba) e da britânica Rodésia do Norte (Zâmbia)).
Foi, desde o início, um veículo que mostrou quão condutor da economia poderia ser para Angola, em geral, e para áreas populacionais e económicas que foram, ao longo dos seus (ainda) 1.866 km, de Oeste (Lobito) para Leste (Vila Teixeira de Sousa/Luau), beijadas pelo um dos maiores “pouca-terra” do continente africano.
Desde que o CFB entrou em actividade e até à independência nunca parou de servir todos os que dele necessitavam. Só entre 1975 (com a crise político-militar fratricida) e 2005/2006 (com a reconstrução da via-férrea e das estruturas que a apoiam, através dos financiamentos e materiais chineses) a actividade do CFB encontrou inúmeras dificuldades operacionais.
Desde que foi reconstruído, o CFB voltou a ser a linha arterial que liga Angola à RDC e à Zâmbia, ainda que com aproveitamento intermitente.
Os custos operacionais eram elevados e – e não poucas vezes –, as infra-estruturas férreas eram postas em causa com a acidentes e incidentes em locomotivas e carruagens do CFB, provocando elevados custos operacionais e financeiros e naturais reservas dos clientes quanto à boa e razoável operacionalidade do CFB.
Estes factos, mais que tornaram o CFB e, por extensão, todo o Corredor do Lobito – e este, como se verá, não é só a linha férrea – pouco mais que inviável, mostrando que havia toda uma necessidade de alterar as condições operacionais vigentes.
Só que dos estudos, das palavras e das boas-vontades aos actos, vai sempre um longo e infindável caminho dentro das burocracias e, principalmente, no seio dos interesses políticos meio-privados.
Acresce que o CFB foi recuperado por fundos e empresas chinesas que, naturalmente, se sentiam ser credores da exploração ferroviária deste enorme empreendimento. No entanto, a sua capacidade gestora e de manutenção mostrou ter poucas bases para mantê-los como “tutores” do CFB.
Havia uma necessidade de rentabilizar aquele que, como já acima descrevi, é a maior via arterial de Angola.
Todavia, e como já referi, o CFB, ou melhor, a linha férrea Lobito-Luau, não pode, de per si, ser caracterizada como a única estrutura do “Corredor do Lobito”. Este é muito mais que o CFB.
Na realidade, e já o defendo desde 2010, o Corredor do Lobito é uma via multi-estrutural rodo-portuário-ferroviária, ligando Sumbe ao Luau, via Lobito, como clarificarei.
Como qualquer estrutura complexa o Corredor do Lobito, tem um coração, que lateja – o porto do Lobito –, uma artéria principal – a linha férrea do CFB – e artérias complementares que ajudam a pulsar e impulsionar o coração – que são as vias rodoviárias que levam para a área portuária lobitanga, todo um manancial de produtos que são produzidos na província do Cuanza-Sul e transportados para o Lobito pelas estradas nacionais desde Sumbe e territórios limítrofes, mais concretamente, a partir das inúmeras e diferenciadas zonas agro-indutriais desta rica província.
Se, à partida, se tem maior ou menor conhecimento de quais os principais produtos que serão – são – canalizados para e do porto do Lobito, via CFB, como adiante será analisado, sintetizemos, genericamente, quais os principais produtos que são provenientes da província do Cuanza-Sul e cujo escoamento – se não forem, o que não me surpreenderia, dada a falta de planeamento que alguns dos nossos decisores sofrem por deficiente formação económica e gestora – é efectuado portuária e, em alguns casos, podem ser e deveriam ser – os custo, em princípio, são menos elevados – pela via férrea, ou seja, pelo CFB.
Estrutura económica do Cuanza-Sul – Apesar do portal do Governo provincial do Cuanza-Sul ser omisso quanto a informações, que não sejam as político-administrativas, é do conhecimento que a província tem sido considerada como uma das que se perfilam como o “mercado abastecedor” (Euronews, 2019) do País – sendo Benguela e Huambo, as outras duas grandes produtoras nacionais (INE,2022) –, nomeadamente nas áreas da pecuária (o maior produtor, representando 16,31% de toda a pecuária nacional, seguido de Benguela), da avicultura, dos laticínios, da agricultura intensiva de pequenos empreendimentos empresariais (correspondendo 87,4% da produção agrícola e ocupando 79,2% da área produtiva da província), das cerealíferas (em especial, milho), das frutas e dos biocombustíveis (Pinto, 2011: 30). A província é a segunda em termos percentuais (14% da actividade laboral do País – a província de Benguela é a maior, com 15% e Luanda, apesar da sua enorme mancha populacional, não ultrapassa 4% (INE, 2022: 71).
Ora toda esta larga actividade económica, independentemente de ter uma boa estrada que liga a província a Luanda, talvez o seu maior consumidor nacional, há um largo espectro de produção agro-pecuária e dos biocombustíveis que carecem de ser exportados para o exterior, em especial no último caso, pelo que o porto do Lobito, por um lado, e o CFB, por outro, são veículos importantes para a economia da província.
Esta situação reforça a minha perspectiva que o Corredor do Lobito tem de ser alargado à província do Cuanza-Sul.
Conclusão – Sabe-se que quando o Corredor do Lobito foi concessionado, por 30 anos, a um grupo empresarial internacional, a Atlantic Railways (incorpora Trafigura (Suíça), Vectorius (Bélgica) e Mota Engil (Portugal)), e que os presidentes de Angola, João Lourenço, e da RDC, Felix Tshisekedi, e da Zâmbia, Hakainde Hichilema, desejam poder vir a ser estendido ao sul, nomeadamente à Namíbia e à África do Sul, por via rodo e ferroviária, uma das premissas era permitir que o CFB possa ser o elo de ligação para o desenvolvimento económico da Africa Austral, no geral, e de permitir que o interland africano tenha uma saída para o mar mais facilitada.
Ao contrário do que defende uma analista portuguesa, o Corredor do Lobito, em geral, e o CFB, em particular, não podem ser, prioritariamente, para transporte de minérios e passageiros (Angola24H, 2023a), mas de todo o tipo de mercadorias.
Certamente que se fosse só para transporte de minérios e passageiros, as empresas que suportam a Atlantic Railways não iriam investir muitos milhões de dólares em 1.555 vagões e 35 locomotivas, só do lado de Angola (Angola24H, 2023b), nem os EUA e a União Europeia iriam financiar este empreendimento em mais de mil milhões de dólares norte-americanos (VOA, 2023).
Face ao que atrás foi descrito, e tendo em conta, a evolução que se prevê, venha a ter o Corredor do Lobito, defendo que este tenha de ser estendido à província do Cuanza Sul, tal como é, por via da extensão do CFB, as províncias de Benguela, Huambo, Bié e Moxico.
Só assim, e não sou gestor ou economista – um ponto que devo esclarecer – o Corredor do Lobito poderá ser devidamente aproveitado por todos que integrarão a área, como dar lucros financeiros aos investidores. Só assim, poderão reinvestir e melhorar todas as infra-estruturas complementares, bem como, o título indica ser a artéria que pode impulsionar a “outra” economia angolana, ou seja, não continuarmos mono-dependentes do petróleo.
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