Contribuição

ENDOCOLONIALISMO

Por Sousa Jamba

Africanos foram maltratados na fronteira da Ucrânia quando tentavam entrar na Polônia. Vários canais internacionais falaram sobre esta discriminação dos negros que tiveram que esperar horas e horas para serem aceites na Polônia. Vários diplomatas Polacos e Ucranianos estão a negar que houve discriminação de negros porque estamos num mundo glabalizado onde tal comportamento é cada vez mais inaceitável. A afirmação de David Sakvarelidze, vice-procurador geral da Ucrânia, de que ele estava triste porque europeus loiros com olhos azuis estavam a ser mortos chocou muita gente pela sua falta de sensibilidade. Muitos de nós choramos quando vimos aquele menino Sírio morto na praia; choramos quando vemos famílias em desespero a serem socorridas no mediterrâneano. Ficamos escandalizados ao ver uma jornalista húngara dando pontapés à refugiados Sírios — incluindo crianças! Ficamos todos indignados ao ver jogadores negros na Europa a serem sugestões à provocações racistas.

Curiosamente, o que as novas tecnologias vão fazer é nos trazer mais próximos das experiências dos outros, para criarmos mais empatia; quando as narrativas são filtradas por preconceitos/ideologias, perdemos a noção de que somos todos uma espécie neste planeta terra com um destino comum. Nós, os Africanos, os negros, somos discriminados em todo mundo — mesmo na Índia! Porém, não podemos cair numa certa armadilha de auto piedade. Na Europa existe hoje o fenômeno de escalões em termos de privilégios de cidadania em que o imigrante ou seus descendentes, não goza dos mesmos direitos. A guerra contra o terrorismo tem tomado contornos de islamofobia e xenofobia que minam as aspirações que celebram o multiculturalismo. Estamos todos conscientes do racismo estrutural no Ocidente e os esforços que estão a ser feitos para superar o mesmo.

Uma jornalista Afro-americana disse que estava surpreendida que havia tantos Africanos na Ucrânia. Em 1997, fiz uma viagem de carro da Alemanha, Áustria, Hungria, Eslovénia (onde fui entrevistado por uma estação sobre os negros na Grã Bretanha) e eventualmente Itália. Na Áustria, me encontrei com um Angolano que vendia videocassetes de músicos Congoleses. Na Eslovénia, lembro-me de uma senhora cujo pai era Ganense; ele tinha encontrado a sua mãe em Belgrado na antiga Jugoslávia. Havia aí muita gente com ligações ao continente Africano. Os Africanos deslocam-se para várias partes do mundo à procura de oportunidades; na Africa Austral está também de gente que veio de várias partes da Europa.

A minha falecida mãe orgulhava-se muito de ter netos e bisnetos com ligações genéticas a várias partes do mundo: Sibéria, Alemanha, Portugal, Austrália, Romênia, Panamá. A Mamã dizia em Umbundu, “Ame ndu Nações Unidas” (Eu sou as Nações Unidas). Os supremacistas e exclusivistas podem andar aos gritos para dividir o mundo; os corações, porém, operam na base de uma outra lógica. Aqui na Zâmbia, tivemos um recente casamento em que uma sobrinha casou com um Polaco — lá estavam os nossos cunhados vindos da Polônia a dançar Tchianda dos Sassa Tchokwe! Logo depois do início dos confrontos na Ucrânia liguei para o meu primo como irmão para saber como estavam os nossos cunhados por lá.

Há, sim, Africanos por todo o mundo — mas não podemos também ignorar as razões que fazem os Africanos saírem dos seus países num número tão elevado para sobreviverem em outras partes do mundo. O ministro dos Negócios Estrangeiros da Nigéria emitiu um comunicado a insistir que os seus cidadãos deveriam ser tratados bem. Mas por que razão este país com tanto petróleo e recursos têm cidadãos que preferem até viver em países em que são tão hostilizados?

No continente Africano temos hoje o fenômeno de Endocolonialismo, em que uma elite que governa decide colonizar o seu próprio país: a elite apodera-se dos recursos do país que são prontamente enviados para o Ocidente. O romancista Tanzaniano, Abdulrazak Gurnah, que acabou de ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, fala dos novos colonos.

O colono Europeu tinha uma missão civilizadora; havia quem lhe fizesse lembrar que as suas práticas no terreno tinham pouco a ver com os ideais que professava. O novo colono só tem uma missão: oprimir e roubar o seu irmão! Em certo caso, os novos colonos até passam a ter estratégias para evitar o avanço de certas regiões dos seus próprios países. O novo colono não dá boa educação, não dá boa saúde, não ajuda o avanço dos seus concidadãos porque — parafraseando Maya Angelou — “ele só consegue estar de pé se os outros estiverem ajoelhados!”.

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