Conjuntura

ANGOLA AINDA LONGE DA PLENA ELECTRIFICAÇÃO NACIONAL E COM OS RECURSOS QUE TEM…

Escrito por figurasnegocios

Recentemente o Governo Angolano fez saber que deseja estender a energia eléctrica por todo o país, face aos actuais 44% – já em 2022 estava nos 42% – alargando esta taxa, até 2050, aos 72%. Entretanto, o Governo admite que, até 2027, tenha de investir cerca de 10.091 milhões USD para atingir uma taxa de eletrificação de 50%, com uma elevada incorporação de energias renováveis, além de estar a ponderar a “desmonopolização” de empresas do sector, dado algumas estarem falidas.


Por: Eugénio Costa Almeida*

Esta é uma medida complementar à que já tinha sido acordada com o Banco Africano de Desenvolvimento, em inícios de 2023, para o reforço financeiro do Programa de Energias Renováveis de Angola (AREP), iniciado em 2019.

Uma medida que tardia se saúda. Só que há factores importantes que o Governo não pode esquecer e que poderão condicionar essa vontade, como a insipiente e deficiente linhas de distribuição eléctrica, a que não é, também, alheio, o vandalismo contra o que já há, devido ao furto de cabos de cobre  e vendidos, depois, de forma ilícita há muitos anos no que parece não haver controlo, claro, das nossas autoridades.

Mas antes de avançar para uma análise mais aprofundada a esta medida, será oportuno fazer algumas considerações sobre a energia eléctrica e como ela deve ser convertida num pólo de desenvolvimento económico nacional.

Como se sabe a energia eléctrica é um dos recursos mais importantes da sociedade moderna e desempenha um papel fundamental no desenvolvimento económico de um país. Com aquela, é possível impulsionar a produção industrial, promover a inovação tecnológica, melhorar a qualidade de vida das populações e estimular o crescimento económico de forma sustentável.

A sua disponibilidade é essencial para a maioria das actividades económicas, desde a produção de bens e serviços até o funcionamento dos equipamentos e infra-estruturas. Sem electricidade, seria impossível manter as fábricas em funcionamento, operar os meios de transporte, iluminar as ruas e as residências, entre muitas outras coisas.

Nos países em desenvolvimento, a falta de acesso à energia eléctrica é um dos principais obstáculos ao crescimento económico. Sem electricidade suficiente e de qualidade, as empresas enfrentam dificuldades para produzir em larga escala, oferecer novos produtos e serviços, expandir seus negócios e competir no mercado internacional. Além disso, a população enfrenta problemas como a escassez de água potável, a falta de comunicação e o isolamento social.

Por sua vez, nos países desenvolvidos, a energia eléctrica é um recurso abundante e essencial para sustentar o alto nível de industrialização, inovação tecnológica e qualidade de vida da população. Nestes países, a electricidade é usada de forma extensiva em sectores como a indústria automobilística, a tecnologia da informação, a saúde e saneamento públicos, etc.

Além disso, a electricidade também desempenha um papel importante na transição para uma economia de baixo carbono e mais sustentável. A partir da utilização de fontes de energia renováveis, como a energia solar, eólica e ou hidro-eléctrica, é possível reduzir as emissões de gases de efeito estufa, proteger o meio ambiente e garantir o bem-estar das gerações futuras.

No entanto, apesar dos inúmeros benefícios da energia eléctrica, ainda existem desafios a serem superados para garantir o seu acesso universal e equitativo. A falta de investimentos em infra-estrutura energética, a desigualdade social, a corrupção e a instabilidade política são alguns dos principais obstáculos que impedem a expansão do sector eléctrico em muitos países.

Para superar esses desafios, é necessário adoptar políticas públicas eficazes, promover parcerias público-privadas, fortalecer a governança e a transparência, e investir em tecnologias inovadoras e sustentáveis. Além disso, é fundamental garantir o acesso à energia eléctrica para todos os cidadãos, em especial às populações mais vulneráveis, como os povos em áreas recônditas, mas também em áreas rurais pouco desenvolvidas.

Durante a pandemia do Covid-19, a importância da energia eléctrica para o desenvolvimento económico tornou-se ainda mais evidente, em especial nos países mais desenvolvidos. Com o aumento da demanda por serviços digitais, como o teletrabalho, ensino à distância, telemedicina, entre outros, a necessidade de uma infra-estrutura eléctrica confiável e de qualidade tornou-se fundamental para garantir a continuidade das actividades económicas e sociais.

Em suma, a energia eléctrica desempenha um papel crucial no desenvolvimento económico de um país, impulsionando a produtividade, a competitividade e a sustentabilidade da economia.

E em Angola, este não é um cenário diferente. O acesso à energia eléctrica é crucial para o funcionamento de diversos sectores da economia, como a indústria, comércio, agro-negócio ou educação. Todavia, o país ainda enfrenta desafios para um fornecimento de energia eléctrica de forma contínua e sustentável.

Angola possui um potencial energético vasto e diversificado, com destaque para as energias hidro-eléctrica, eólica, solar e biomassa. Porém, a exploração dessas fontes de energia ainda é incipiente, o que tem levado a uma dependência excessiva de energia térmica, muitas vezes importada de países vizinhos. Isso gera custos elevados para o país, além de impactos negativos no meio ambiente, devido à queima de combustíveis fósseis.

A falta de infra-estrutura energética adequada também tem limitado o acesso à electricidade em diversas regiões do país, o que compromete o desenvolvimento económico e social de Angola. Sem energia eléctrica, as empresas têm dificuldade em operar de forma eficiente, o que impacta diretamente na produtividade e competitividade do país no cenário internacional. Além disso, a falta de electricidade em áreas rurais dificulta o acesso a bons e carentes serviços básicos, como saúde e educação plenas.

Diante desse cenário, o Governo tem procurado investir na diversificação da matriz energética do país, com foco no desenvolvimento de fontes de energia renováveis, porque estas são uma alternativa sustentável e ambientalmente amigável, contribuindo para a redução dos custos de energia eléctrica, bem como melhora o acesso à electricidade em todo país.

A energia hidro-eléctrica é uma das principais fontes de energia renovável em Angola, destacando-se a barragem de Laúca, com capacidade para gerar cerca de 2070 MW de energia eléctrica. Além disso, o país também tem potencial para a geração de energia eólica, especialmente na região do Namibe, e energia solar, com alto índice de radiação solar em diversas partes do país.

Apesar do Governo estar a investir em parcerias com empresas estrangeiras e em projectos de energia renovável, visando aumentar a produção de electricidade a partir de fontes limpas e reduzir a dependência de energia térmica, é evidente que ainda há desafios a serem superados para a expansão das energias renováveis no país, sendo um dos principais obstáculos,  a falta de infra-estrutura adequada e de capacidade técnica para a implementação de projectos neo-energéticos em larga escala

Para superar esses desafios, é necessário que o Governo promova políticas públicas que incentivem a produção e o consumo de energias renováveis, assim como a capacitação e o desenvolvimento do sector energético no país. Mais, é fundamental que sejam estabelecidos marcos regulatórios claros e estáveis, que garantam segurança jurídica e previsibilidade para os investidores privados, em especial, estrangeiros, na energia renovável.

O desenvolvimento económico de Angola está directamente relacionado com a expansão do acesso à energia eléctrica e à diversificação da matriz energética do país. Como já foi referido a promoção de energias renováveis é fundamental para garantir um fornecimento de electricidade mais seguro, limpo e acessível para a população, bem como contribui para a mitigação dos impactos ambientais decorrentes de energia fóssil.

E há valências que ganhariam, e muito, pela maior electrificação do país. A electrificação das linhas ferroviárias seria muito importante para o desenvolvimento económico do país, das áreas regionais envolventes e para redução de custos operacionais e de transportes, principalmente, para os países vizinhos, como seria no caso do «Corredor do Lobito», seja na versão estatal do  Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB), seja na versão do triplo P (Parceria-Público-Privada) com a “Lobito Atlantic Railways SA” . E, isto, foi recentemente alertado pelos investidores norte-americanos, através da iniciativa “Power Africa”, um mecanismo que, de acordo com as suas expectativas, facilitará o acesso à energia e electrificação daquele que é o maior corredor de desenvolvimento do país.

Eis alguns dos impactos positivos que a electrificação das ferrovias teria:

  1. Redução das emissões de gases de efeito estufa, devido às emissões de gases poluentes, bem como melhoria da eficiência energética, já que os comboios eléctricos são mais eficientes que os a diesel, levando a menor consumo de energia e redução dos custos operacionais;
  2. Menor dependência de combustíveis fósseis, tornando o transporte mais sustentável e resiliente a flutuações dos preços do petróleo, ainda que no caso nacional, a nossa maior preocupação é a importação de produtos petrolíferos transformados que oneram substancialmente, os custos de transportes, manutenção e produção;
  3. Redução da poluição sonora, porque os comboios eléctricos são mais silenciosos que os a diesel, havendo, assim, redução de poluição sonora ao longo das vias ferroviárias e melhoria da qualidade de vida das comunidades próximas;
  4. Melhoria na segurança do sistema ferroviário.

Resumindo, a electrificação das vias ferroviárias apresenta impactos positivos em termos de redução das emissões de gases de efeito estufa, melhoria da eficiência energética, diminuição da dependência de combustíveis fósseis, redução da poluição sonora e melhoria da segurança do sistema ferroviário. Um passo importante na transição para um sistema de transporte mais sustentável e ambientalmente amigável.

Em conclusão, dado que as energias renováveis têm, cada vez mais, um papel estratégico no desenvolvimento económico de um país, fornecendo mais que uma alternativa sustentável e ambientalmente amigável para a produção de electricidade num país, é conveniente que Angola avance, efectivamente, para a produção de energia eléctrica baseada nas energias renováveis de que somos um caso feliz de múltiplas formas de as obter, e em custos baixos tais as valências a que o país foi ofertado – vastos recursos hídricos, muitas horas solares e bastante vento – pelo que podemos ser um dos maiores produtores e, até, exportadores de energia eléctrica para países vizinhos.-


BIBLIOGRAFIA:
Alexandre, Isaac. (2023). Análise do Sector elétrico Angolano e estratégias para o futuro; https://pt.scribd.com/document/623597109/Anlise-do-Sectorelectrico-Angolano-e-estratgias-para-o-futuro
Angola precisa de investir 11.000 ME para eletrificar 50% do país até 2027; RTP-Online, 10Maio2024,15:28; https://www.rtp.pt/noticias/economia/angola-precisa-de-investir-11000-me-para-eletrificar-50-do-pais-ate-2027_n1570593
BAfD. (2023). Em Angola, o Banco Africano de Desenvolvimento apoio o Setor das Energias Renováveis; https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/em-angola-o-banco-africano-de-desenvolvimento-apoio-o-setor-das-energias-renovaveis-59125
Daniel, Miguel. (2024). Energia. Melhorar o transporte e distribuição é o desafio do setor, diz director nacional; Novo Jornal, 10Maio2024; https://novojornal.co.ao/economia/interior/energia-melhorar-o-transporte-e-a-distribuicao-e-o-desafio-do-sector-diz-director-nacional-118270.html
Marcos, João. (2024). EUA querem Corredor do Lobito na rota do acesso à electricidade; VOA (online) setembro 25, 2024; https://www.voaportugues.com/a/eua-querem-corredor-do-lobito-na-rota-do-acesso-%C3%A0-electricidade/7799162.html
Pascoal, Weza. (2024). Governo angolano empenhado em garantir produção de energias renováveis até 2025; Jornal de Angola, 10Junho2023; https://www.jornaldeangola.ao/ao/noticias/governo-angolano-empenhado-em-garantir-producao-de-energias-renovaveis-ate-2025/
Veloso, Adérito. (2024). Sistema eléctrico nacional deve interligar quatro países vizinhos; Jornal de Angola, 06/02/2024; https://www.jornaldeangola.ao/ao/noticias/sistema-electrico-nacional-deve-interligar-quatro-paises-vizinhos/

*Investigador Colaborador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL (CEI-IUL), Investigador Sénior Associado do Centro de Estudos para o Desenvolvimento Social e Económico de África (CEDESA-ARN) e Investigador-Associado do CINAMIL e Pós-Doutorado da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto**
** Todos os textos por mim escritos só me responsabilizam a mim e não às entidades a que estou agregado

 

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