Sociedade

“Fumaça Branca” À ESPREITA NAS CHAMINÉS DA ÁFRICA DO SUL

Escrito por figurasnegocios

Como havia previsto e, na verdade, pelo que eu próprio aspirava, como australo-africano e africano, o sistema perceptivelmente transparente, aberto à diversidade e respeitador das instituições republicanas (pelo menos se comparado ao nosso), acabou, ontem, por encontrar uma saída, provavelmente, promissora em relação aos males que se instalaram, a seguir ao fim do apartheid, na África do Sul. A saber, o entusiasmo acrítico e balofo por um nacionalismo racial-africanista negro, supostamente em contraposição necessária ao politicamente defunto nacionalismo separatista bóer.


Há muito que vinha notando as dificuldades em que seguidores, dentro do ANC, do que um dia chamei de “ubuntuism sublimado” de Tutu e Mandela, se encontravam encurralados, por defensores de um africanismo demagogo, segundo o qual o problema estará na cor da pele das pessoas ou que propaladas ideologias seriam eternamente correctas ou incorrectas. A Filosofia Ubuntu (ou ubuntuism), tal como foi sublimada ao longo das interconexões entre comunidades negras, brancas e de outros estratos sócio-antropológicos, na África do Sul, ensina-nos que a solução deve ser encontrada na cooperação entre as comunidades “condenadas” a conviver sob o mesmo tecto pátrio e no reconhecimento e tolerância perante as inelutáveis diferenças.

O bispo Tutu dizia, mais palavra menos palavra, que brancos e negros, na África do Sul, são como que dois homens amarrados pelos pulsos e atirados para um poço, de onde só poderão emergir se coordenarem, e bem, os seus movimentos. Vai alguns anos, o académico Moeletsi Mbeki (irmão do ex-presidente Thabo Mbeki) escreveu que o afastamento progressivo de brancos sul-africanos de postos de governação e da direcção de vários sectores de planificação estratégica, traria cedo ou tarde alguns dissabores. Pasme-se, uma das áreas elencadas por Mbeki, como próximas de ruptura, foi justamente o sector energético, em relação ao qual, um certo “relativismo” nosso refere como tendo ultrapassado a dramaticidade da situação da “especial” Angola, nos seus apagões e deficits. No texto relacionado anterior, aludi a outras consequências gravosas, resultantes, em muitas das nossas áfricas, desse demagógico racismo ao contrário, em que africano parece significar escuro.

Males que vêm por bem, parece que a providência está a ajudar o ANC a libertar-se desta nuvem africanista negativa. Esta que tanto enfraqueceu um país próspero como foi o Zimbabwe. Pois, parece estarmos a ver essa antiga agremiação política, a decantar-se, pela via democrática e sem grandes dramas, primeiro do extremismo ideológico de Julius Malema e, agora, da tentativa de exploração do “nacionalismo” zulu e das glórias da luta armada contra o apartheid, ao serviço da vingança do lendário Zuma, contra o antigo sindicalista Cyril Ramaphosa.

Eu congratulo-me com a fórmula de governo de unidade nacional encontrada, sob a iniciativa do ANC “remanescente”. Pois, trata-se de tentar travar a decadência da moderna e africana África Sul, com todas as suas cores e não de “salvar” o ANC, como diz o velho Zuma, dos tempos do Umkonto we Sizwe que já cumpriu, e bem, a sua missão, há várias décadas. Claro que os antigos combatentes devem ser tratados com dignidade, mas nunca à custa das massivas gerações actuais e futuras.

O que não progride, por enquanto, é a nossa situação, onde o nosso “ANC”, até não já dirigido, maioritariamente, por antigos combates, amarrou de tal maneira o país aos desígnios das suas supostas antigas e exclusivas glórias, que só ainda não batemos no fundo, porque, provavelmente o fundo, afinal, não existe. Haverá que ser inventado. Na paz e concórdia que servirão a todos.

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