Marcelo nem era suposto estar ali. Os jovens que tinham marcado presença na edição deste ano da Universidade de Verão do PSD tinham sido informados de que iriam ouvir o Presidente da República à distância e, quando chegou a hora da sua intervenção, até estavam de olhos postos na transmissão de uma cadeira no Palácio de Belém. Mas, por ser a última vez que marca presença neste evento como chefe de Estado, decidiu fazer uma surpresa e entrou de rompante e sob aplausos no Hotel Sol e Serra, em Castelo de Vide.
Num discurso onde sublinhou que seria a última vez que poderia “opinar” sobre “primeiros-ministros, governos e líderes da oposição”, as palavras mais marcantes não tiveram como alvo nem líderes portugueses, nem europeus. O Presidente da República foi notícia internacionalmente por ter dito a seguinte frase sobre Donald Trump: “O líder máximo da maior superpotência do mundo, objectivamente, é um activo soviético, ou russo”. Acrescentou isto também: “Em termos objectivos, a nova liderança norte-americana tem favorecido, estrategicamente, a Federação Russa”.
As palavras de Marcelo, que surgem poucos dias depois de ter sido condecorado pelo presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, geram um “conflito diplomático” entre Portugal e Estados Unidos, como admitem diplomatas e especialistas em Relações Internacionais à CNN Portugal.
E, desta vez, a situação pode ser mais difícil de resolver do que a competição de apertos de mão entre Marcelo e Trump na visita à Casa Branca em 2018.
Já o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, que também presente no encontro com os jovens, decidiu não comentar a posição de Marcelo, desvinculando-a da do Executivo. “É através do Governo que as posições de Portugal são veiculadas”, garantiu.
Ao final desta sexta-feira, o comentador Miguel Baumgartner haveria de dizer na CNN Portugal que o chefe da diplomacia portuguesa ficou “bastante irritado” com estas palavras.
Certo é que o Presidente da República não está sozinho na ligação que faz entre o presidente norte-americano e os serviços secretos russos. Em fevereiro deste ano, Anur Mussayev, um antigo responsável do KGB, fez uma publicação no Facebook onde afirmou que Trump foi recrutado pelos serviços secretos russos em 1987, durante uma viagem a Moscovo. Na altura, o actual presidente dos EUA tinha 40 anos e tinha projectos para construir dois hotéis de luxo na Praça Vermelha.
Mussayev disse que foi atribuído o nome de código “Krasnov” ao líder norte-americano.
Mais recentemente, o deputado britânico Graham Stuart também sugeriu a mesma ligação. Na sua conta oficial no X, o conservador afirmou que “temos de considerar a possibilidade de o presidente Trump ser um activo russo”. “Se assim for, a aquisição de Trump é a coroação da carreira do FSB de [Vladimir] Putin – e a Europa está por sua conta”. Mais tarde, pressionado em antena pelos jornalistas da BBC, disse não ter provas para sustentar o seu argumento, insistindo nele: “O que temos é um presidente que não faz absolutamente nenhuma exigência ao agressor, ao ditador, ao homem que subverteu a sociedade russa e que procura diariamente subverter a nossa sociedade, como temos visto ao longo dos anos”.
Nenhuma destas teorias foi comprovada e ambas foram desmentidas em fact checks, como este da Euronews.
Em fevereiro, Marcelo já tinha também acusado Trump de liderar uma estratégia para fazer “corroer a NATO”. “Os Estados Unidos da América parecem, neste momento, ter decidido favorecer a Federação Russa e os seus aliados, na situação existente na Ucrânia, em detrimento da UE”. Quando Trump foi eleito, em outubro do ano passado, o Presidente português felicitou-o desta forma:
“Portugal tem uma longa e profícua relação com os EUA, que continuará a cultivar no interesse dos dois povos, incluindo da extensa comunidade de portugueses e lusodescendentes naquele país e do crescente número de norte-americanos no nosso país.
O reforço da relação transatlântica continuará a ser um objectivo comum e uma prioridade para Portugal”.
Ter-se-á Marcelo esquecido dessa ligação e desses imigrantes e lusodescendentes?



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