A corrida geo-estratégica das grandes potências mundiais por África é um fenómeno complexo e multifacetado que se intensificou nas últimas décadas, especialmente após o início do século XXI. Este interesse crescente por parte de potências como Estados Unidos da América (EUA), China, Rússia, Índia e União Europeia (UE), é impulsionado por vários factores, incluindo a abundância de recursos naturais, o potencial de crescimento económico, a presença de uma população eminentemente jovem e mais apelativa à recepção de novas tecnologias, a importância geopolítica da região e a busca por alianças estratégicas.
A corrida geo-estratégica das grandes potências mundiais por África é um fenómeno complexo e multifacetado que se intensificou nas últimas décadas, especialmente após o início do século XXI. Este interesse crescente por parte de potências como Estados Unidos da América (EUA), China, Rússia, Índia e União Europeia (UE), é impulsionado por vários factores, incluindo a abundância de recursos naturais, o potencial de crescimento económico, a presença de uma população eminentemente jovem e mais apelativa à recepção de novas tecnologias, a importância geopolítica da região e a busca por alianças estratégicas.
1. Recursos naturais – África é rica em recursos minerais e energéticos, como petróleo, gás natural, ouro, diamantes, cobalto e lítio. A demanda global por esses recursos tem sido um motor significativo para o engajamento internacional.
Por exemplo, a China tem investido pesadamente em infra-estrutura e mineração na África, garantindo acesso a recursos essenciais para sustentar seu crescimento económico.
Já por sua vez, a Rússia, além de procurar diversificar suas fontes de recursos procura garantir acesso a matérias-primas essenciais
Quanto aos EUA, a África possui vastos recursos naturais, incluindo petróleo, gás, minerais e terras aráveis. Os EUA buscam garantir o acesso a esses recursos para satisfazer suas necessidades energéticas e industriais.
Já para a Índia África é rica em recursos naturais, como petróleo, gás, minerais e terras agrícolas, pelo que a Índia, com sua crescente demanda por energia e recursos, vê o continente africano como um fornecedor estratégico.
2. Crescimento económico – O continente africano, apesar de suas crises e desafios, apresenta um dos crescentes mercados mais promissores do mundo. Com uma população jovem e em crescimento, e várias economias projetadas para crescer a taxas altas, muitos países estão olhando para a África como uma oportunidade de investimento. O fortalecimento das economias africanas pode alterar a dinâmica do comércio e das relações internacionais.
Daí que as grandes potências tudo estejam a fazer para se melhor posicionarem na obtenção de matérias-primas importantes para o seu desenvolvimento, mas, na maioria dos casos, esquecendo de procurar fazer um retorno tão igualitário quanto o possível. Na realidade, algum do retorno que existe, apresenta contrapartidas leoninas para os países africanos, que, em muitos casos, se tornam impossíveis dos países africanos lá chegarem. E quando chegam, como veremos adiante, os impactos são negativos.
3. Geopolítica e segurança – O aumento das tensões entre grandes potências, especialmente entre Estados Unidos e China, faz com que a África se torne um campo de batalha geoestratégico. A influência no continente pode significar acesso a bases militares, alianças estratégicas e um papel mais significativo nas organizações internacionais. As Nações Unidas, a União Africana e outras entidades regionais são cada vez mais arenas em que essas potências buscam expandir sua influência.
E isto se constata nas alianças políticas, de que se ressalvam, pela importância efectiva, e por crescendo de actual relevância, China, Rússia, EUA, India e União Europeia (UE):
i. A China, no presente contexto internacional, posiciona-se como a potência com mais peso em África. A sua estratégia tem tido um ponto focal na corrida pelo Continente Africano e que passa, essencialmente, pelo investimento em milhares de milhões (na versão brasileira-americana, bilhões ou bio) de dólares em infra-estrutura, como portos, ferrovias e estradas, em troca de recursos naturais e livre acesso aos mercados internos. Este modelo de desenvolvimento, no entanto, também levanta questões sobre a dívida e a soberania dos países africanos.
Pode-se afirmar, ainda que com alguma natural reserva, dado que de início a cooperação sino-africana começou muito antes, que a presente relação com África começa, também ela, a ser marcada pelo expediente “Belt and Road Initiative” que se está a tornar num dos principais pilares da política externa económica da China em que procura aumentar a conectividade e o comércio entre a China e diversas regiões do mundo, incluindo a África, ainda que nos últimos anos, principalmente após a pandemia do SARS-CoV-2 (Covid 19), a China tem entrado em algum menor crescimento económico, sem que isso leve a reduzir a sua forte presença na vida política, económica e, de certa forma, financeira em no Continente Africano até porque este continua a ser visto como uma chave para a expansão da infra-estrutura e das rotas comerciais, dado que, sendo África um mercado em expansão e apresenta uma população jovem e em crescimento, com uma classe média em ascensão, o que a torna um mercado atractivo para produtos chineses.
Ora para esta tão vigorosa cooperação sino-africana muito contribuiu a sua política de diplomacia de desenvolvimento, em que a China adopta uma abordagem discreta (low-profile), oferecendo assistência financeira e projectos de infra-estrutura em troca de acesso ao que os chineses mais precisam: recursos de mineração e mercados. Esses investimentos costumam ser feitos com condições favoráveis, muitas vezes sem as exigências de reformas políticas que países ocidentais ou organizações financeiras ocidentais (FMI ou Banco Mundial) costuma impor.
Só que, começa a haver alguma reserva por parte das autoridades chinesas quanto aos investimentos e aos seus retornos financeiros, dada a elevada dívida que alguns países africanos já apresentam e, em alguns casos, com dificuldades em pagá-los. Por exemplo, a dívida do Quénia pela construção da linha férrea entre o porto de Mombaça e Nairobi e financiada pelo Exim Bank of China em duas tranches de cerca de 5.300 milhões de dólares, estava sob ameaça de penhora do porto de Mombaça pelo incumprimento, sistemático, do pagamento dela, como afirmava, em 2018, o jornal queniano Nation, que citava um relatório do auditor-geral do país. De notar, todavia, que os documentos que mostram os acordos de financiamentos, apresentam os tais contratos leoninos que são sempre vantajosos para os financiadores, e que levou, recentemente, um tribunal queniano considerar este contrato ilegal por “ter infringido as leis de aprovisionamento do país”.
Ora esta crescente influência chinesa leva a que alguns críticos apontem que os seus investimentos podem levar a um neo-colonialismo, onde a exploração de recursos resulte em benefícios sustentáveis para as populações locais.
ii. Desde a implosão da antiga União Soviética que a Rússia, em particular com os consulados de Putin, tem promovido uma diplomacia activa, especialmente em países com regimes autocráticos ou que se opõem ao Ocidente. Essa abordagem visa formar uma coligação de países dispostos a apoiar a Rússia em fóruns internacionais, como na ONU. Em particular, desde a invasão russa da Ucrânia, que, na ONU mostrou ter conseguido dividir os países africanos entre os que apoiavam sanções, entre os que condenavam as sanções e, a maioria, os que se mantiveram neutros.
A política russa não se fica pela diplomacia política, recentemente consubstanciada nos Fóruns Rússia-África, e estes factos podem ser verificados quer no âmbito económico, com diversos apoios tanto económicos, como financeiros, como, por exemplo o apoio à construção de centrais nucleares no Egipto e na África do Sul ou financiar construção de fábricas de armamento e de equipamentos militares, como os previstos para serem construídas em Angola; quer, e ultimamente, com a presença militar em África, seja através acordos de segurança e defesa com várias nações africanas – ressalve-se os recentes acordos com São Tomé e Príncipe e que despoletou a evidência de haver outros similares com outros países PALOP – quer por via do uso de mercenários (ou para-militares, como hoje gostam de os referir), como o antigo Grupo Wagner (GW, hoje, denominados de Africa Corps, que, por acaso, era a denominação que a Wehrmacht (exército) nazi usava para denominar as suas forças em África, a Afrika Corps), que tem sido uma estratégia para projectar poder sem compromissos formais; nestes casos, de destacar Moçambique em que o GW foi dos primeiros a combater os rebeldes islâmicos, em Cabo Delgado, na República Centro-Africana (RCA) e, mais recentemente, aproveitando os recentes Coup d’État (Golpes de Estado) militares no Mali, Burkina Faso e Níger, a afirmarem-se como conselheiros e suportes militares. Não esquecendo que «não há almoços grátis» e a RCA bem o sabe, estes apoios acabam por ser bem pagos em matérias-primas importantes, como ouro e, ou, urânio.
iii. Por sua vez os EUA, num um mundo cada vez mais multipolar, e que estiveram um pouco arredados das questões africanas com o fim da Guerra-Fria, só “retornando” com Obama, procuram retomar sua influência na África para contrabalançar a presença crescente de China e Rússia, pelo que têm investido pesadamente em infra-estruturas e no desenvolvimento de alguns países Africanos, conseguindo, em alguns casos – Angola é um destes, ao ponto de estar confirmado como sede da próxima Cimeira empresarial EUA-África, a decorrer em 2025 – travar a influência da China e da Rússia.
A principal sua lança de penetração, além de diferentes acordos bilaterais, tanto económicos como militares – criando para o efeito a figura de African Partner Nations (APN) –, é a US-Africom, apresentando-se, esta, como o seu exponente máximo de cooperação em matéria de segurança e defesa.
Mas, naturalmente que os EUA, estão a procurar ir mais longe. Daí que a sua mais recente iniciativa política tenha sido o de defender a criação de dois lugares permanentes no Conselho de Segurança da ONU para os países africanos, embora sem direito de veto. Um princípio que se saúda e que impele uma reforma da ONU.
iv. Quanto à Índia, que foi o que mais tarde de aproximou da África moderna, apesar de estar na mesma linha política de cooperação com países africanos como os antecedentes, só vê a China como seu concorrente na penetração em África.
Para isso, a Índia promove a diplomacia do Sul-Sul nas suas relações com a África, enfatizando a solidariedade entre países em desenvolvimento. Isso é exemplificado em iniciativas como o Fórum Índia-África e a Cooperação Técnica e Económica da Índia para África (ITEC) que ajudam a solidificar sua imagem como um parceiro de desenvolvimento, investido em projetos de infra-estrutura, saúde e educação em vários países africanos, bem como na compra de vários produtos africanos, além de matérias-primas essenciais, como, por exemplo, caju, como, também, e aproveitando o elevado número de africanos jovens, vender material tecnológico de telefonia móvel (celulares).
Se as políticas indianas passam, no essencial, pelo apoio ao desenvolvimento económico, financeiro e tecnológico, a vertente militar não foi esquecida, pelo que tem colaborado com países africanos em segurança marítima, especialmente na luta contra a pirataria no Golfo de Áden e no Oceano Índico, de que o recente Exercício Trilateral Índia-Moçambique-Tanzânia (IMT TRILAT 24) é um exemplo.
v. Quanto à União Europeia (UE) face à presença de uma população jovem e em crescimento, a África representa um mercado em potencial significativo, onde empresas e governos europeus olhem África como uma oportunidade de investimento e expansão económica.
Todavia, a segurança e a estabilidade, ou falta delas, em África representam para os europeus factos que determinam alguns constrangimentos. Entre estes registam-se o terrorismo, a migração forçada e irregular (ou ilegal, clandestina) e conflitos internos que exigem uma abordagem de segurança colaborativa, bem como mudanças climáticas que provocam e geram mais migração irregular.
A UE como a primeira grande fonteira externa de África, tem procurado promover estabilidade o Continente para impedir crises que poderiam ter repercussões directas na Europa, seja através do aumento da migração irregular africana, seja pelo facto de alguns – muitos – dos migrantes não conseguirem se integrar na vida social, política e económica europeia, tanto por razões culturais, como religiosas, ou económicas. .
5. Resistência local e soberania – Embora a corrida por influência externa tenha trazido investimentos e desenvolvimento para alguns países africanos, há uma crescente consciência sobre a importância da autonomia e da soberania. Muitos líderes africanos estão procurando diversificar suas parcerias, equilibrando as relações com várias potências e promovendo políticas de desenvolvimento que priorizem as necessidades locais e a sustentabilidade. Angola é um exemplo disto.
6. Conclusão – A corrida geo-estratégica das grandes potências por África é uma realidade que traz tanto oportunidades quanto desafios.
Para isto muito contribui o facto de o Continente possuir um potencial enorme que pode ajudar a contribuir para o desenvolvimento económico global. Todavia, é necessário, é fundamental, que o gerenciamento das relações externas garanta que os interesses africanos sejam priorizados.
Para isso é imprescindível que os dirigentes africanos e os financiadores busquem uma abordagem que equilibre desenvolvimento, sustentabilidade e soberania para que a África possa trilhar um caminho próspero e independente em meio a essas complexas dinâmicas globais.
ATÉ LÁ, VAMOS AGUARDAR…
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