Conjuntura

TEM ANGOLA CAPACIDADE PARA OFERECER UM TURISMO DE QUALIDADE?

Nos anos mais recentes, o Governo angolano tem procurado, e bem, diversificar a economia nacional, em particular, as exportações, factor catalisador prioritário para obtenção de dívidas externas. E um desses principais catalisadores é o turismo, de que Angola tem procurado tentar oferecer aos estrangeiros, em especial – a persistente falta de divisas externas, assim o exigem –, e aos nacionais.


Por: Eugénio Costa Almeida*

Só que Angola, apesar de seu elevado potencial económico, enfrenta vários desafios, incluindo uma economia em desenvolvimento, políticas económicas instáveis, infra-estruturas rodoviárias deficientes – estradas locais e nacionais com transitabilidade a roçar o impossível –, infra-estruturas aeroportuárias mais actualizadas, seguras e eficientes – aguardemos o que trará o AIAAN1 – e ferroviárias exíguas – de que escapa a linha férrea do Caminho-de-ferro de Benguela (CFB) ou, como é reconhecido, Corredor do Lobito, considerado como uma excepção neste cenário, com uma infra-estrutura ferroviária de qualidade que facilita o transporte de minérios e de pessoas entre o litoral e o interior de Angola, até à fronteira com a República Democrática do Congo (RDC) –, as deficientes condições sanitárias, ou o elevado nível de desemprego, em especial, o desemprego jovem em Angola é um problema sério, com uma taxa alarmante de jovens que não conseguem encontrar emprego, tendo, por isso, um impacto negativo não apenas na vida desses jovens, mas também no desenvolvimento económico e social do país como um todo, entre outras causas.

Na perspectiva de muitos investidores, estas causas agregadas a uma elevadíssima dívida externa que atingiu níveis alarmantes nos últimos anos, com estimativas a apontar para mais de 50% do PIB –grande parte desta dívida é proveniente de empréstimos feitos com a China, para financiar projectos de infra-estruturas e desenvolvimento –, a uma corrupção ainda um pouco alta, uma má gestão dos recursos públicos e uma considerada persistente falta de transparência, e pelo facto da nossa moeda, o Kwanza, continuar, persistentemente, a depreciar-se o que tem contribuído para uma elevada inflação, aliado à falta de divisas externas – que limita o desenvolvimento do turismo em Angola – diminuindo a capacidade do governo de promover o turismo internacionalmente e atrair investimentos estrangeiros, bem como dificulta a importação de equipamentos e insumos2 necessários para o funcionamento do sector do turismo, além de encarecer os custos de viagem para os turistas estrangeiros, são consideradas como constrangedoras para que eventuais e necessários stakeholders3 invistam para que o desenvolvimento económico angolano seja uma clara realidade, em particular, para que Angola se torne atractiva para o turismo.

Mas será que o turismo, considerado, actualmente, como um dos mais importantes veículos de exportação e um dos principais factores de criação de divisas externas, pode ser um agente importante para a exportação angolana? Veremos quais as condições para se ter um turismo sustentado, o que mais se deseja nos tempos corridos?

  1. incentivar a existência de uma boa infra-estrutura de transportes, hospedagem, alimentação, lazer e serviços para garantir o conforto e a segurança dos turistas;
  2. ter uma variedade de atracções turísticas, como património histórico, belezas naturais, eventos culturais e gastronomia local, é fundamental para atrair e satisfazer os visitantes;

iii. promover o intercâmbio cultural e a diversidade, contribuindo para a valorização da identidade nacional e o enriquecimento da experiência dos visitantes;

  1. apresentar uma qualidade dos serviços, pelo que é essencial oferecer serviços de qualidade, desde o atendimento ao turista até a gestão de eventos e actividades turísticas, para garantir uma experiência positiva para os visitantes;
  2. diligenciar o turismo sustentável, respeitando a cultura local, protegendo o meio ambiente e apoiando a economia local, é fundamental para garantir a preservação dos recursos naturais e culturais da região;
  3. ser importante investir em estratégias de promoção e marketing para atrair turistas e divulgar os atractivos da região, tanto a nível nacional como internacional;

vii. procurar garantir a segurança dos turistas, com medidas de prevenção de acidentes, cuidados com a saúde, controle da criminalidade e assistência em situações de emergência, é essencial para manter a confiança dos visitantes;

viii. investir na formação e capacitação dos profissionais do sector turístico, como guias turísticos, agentes de viagens, hoteleiros e restaurateurs4, é essencial para garantir um serviço de qualidade e uma experiência positiva para os turistas.

Face a estes importantes factores do e sobre o turismo, será que teremos e quais serão as potencialidades de Angola em termos de turismo?

De uma maneira geral, o País possui um vasto potencial turístico devido à sua rica biodiversidade, paisagens naturais deslumbrantes, cultura diversificada, história fascinante e clima tropical favorável, de que se destaca:

  1. a) a existência de vários e capacitados parques nacionais e zonas protegidas, como os da Kissama, de Iona, de Bicuar, de Kangadala, ou a área de Conservação Transfronteiriça Cubango-Zambeze, entre outros, que oferecem oportunidades únicas para observar a vida selvagem africana e uma variedade de aves;
  2. b) Angola possui mais de 1.600 kms de costa atlântica com praias de areia branca e águas cristalinas, ideais para a prática de desportos aquáticos, como surf, mergulho, snorkeling5 e pesca;
  3. c) a presença de um reconhecido património cultural com uma rica herança cultural, incluindo locais históricos como a Fortaleza de São Miguel (Luanda) ou o Forte Mwene Vunongue (Menongue, província do Cuando-Cubango), as Igrejas de Nossa Senhora da Muxima (Muxima, Luanda) ou da Nossa Senhora da Arrábida (Lobito), ou os Museus Nacional de Antropologia (Luanda), de Arqueologia (Benguela) e o da Tentativa (Caxito), que oferecem saberes fascinantes sobre a história e cultura do país – estão registados cerca de 270 monumentos e sítios classificados, ainda que alguns em situação degradada;
  4. d) o ecoturismo em Angola evidencia uma grande variedade de ambientes naturais, como savanas, florestas tropicais, desertos, deltas de rios e lagos e lagoas (de que se destacam a Lagoa de Kambadua, na província do Bié, ou as Lagoas de Sassa-Zau, de Manenga e de Tchúquisse, na província de Cabinda), que oferecem oportunidades para o ecoturismo e turismo de aventura, como caminhadas, safaris, passeios de barco e observação de aves;
  5. e) Angola tem uma vibrante cena cultural, com festivais de música, dança, arte e gastronomia ao longo do ano, proporcionando aos visitantes uma experiência autêntica da cultura angolana.

Resumindo, Angola apresenta um grande potencial para crescer e desenvolver um turismo expandido, sustentado e criador de riqueza, atraindo viajantes internacionais em busca de experiências únicas e enriquecedoras. Mas…

Só que, como já foi referido anteriormente, o País ainda apresenta factores que condicionam o desenvolvimento do turismo como os altos custos associados a viagens internacionais e estadias em hotéis que podem tornar Angola um destino caro para os turistas, ou as dificuldades no processo de obtenção de vistos, com processos complexos e demorados para obtenção de vistos podem desencorajar potenciais turistas de visitar Angola.

Ainda assim, e é um facto importante e que se deseja tenha continuidade, segundo recentes palavras do Secretário de Estado do Turismo, Hélder Marcelino6, Angola já começa a mostrar uma capacidade de captação de cerca de 17 mil estrangeiros/mês, a maioria de origem europeia e de receber acostagem de grandes paquetes de turismo, bem como de já ter acontecido duas viagens ferroviárias turísticas de luxo,  entre Dar-es-Salam (Tanzânia) e Lobito7.

NOTAS:

1 Aeroporto Internacional Dr. António Agostinho Neto (AIAAN) – inicialmente denominado Aeroporto Internacional de Bom Jesus do Cuanza –, oficialmente inaugurado em 10.Nov.2023, está localizado no município de Icolo e Bengo, província de Luanda, a cerca de 40 km do centro da capital angolana, Luanda;

3 Stakeholders são, genericamente investidores/accionistas; todavia, um stakeholder pode ser considerado um conceito técnico-empresarial em que pessoas ou grupos que estão de alguma forma ligados a uma empresa – inclui funcionários, clientes, investidores, fornecedores e até mesmo a comunidade ao redor dela – que representam um grupo de interesse na empresa e são afectados por suas acções e decisões;

4 Restaurateurs ou, menos usual até na língua inglesa, restaurant owners, são os donos e, ou, gerentes principais de restaurantes;

5 Snorkeling é a prática de mergulho, em que o praticante pode ficar submerso nas águas do mar e respirar com a ajuda do snorkel (tubo respirador) e a águas de profundidade reduzida ou até cerca de 40 cm (se mo saber, fiz – fizemos os da minha geração – muitas vezes snorkeling);

2 Insumo, em economia, designa todas as despesas e investimentos que contribuem para a obtenção de determinado resultado, mercadoria ou produto até o acabamento ou consumo final, ou seja, e por outras palavras, designa um bem ou serviço utilizado na produção de um outro bem ou serviço, no que inclui cada um dos factores produtivos como o capital, matérias-primas, uso de equipamentos, horas de trabalho, necessários para produzir  bens de consumo, bens intermediários e bens de capital;

6 Palavras citadas pelo diário Jornal de Angola, de 14.Abr.2024, pág. 40;

7 Viagens patrocinadas pela empresa sul-africana Rovos Rail, em que a primeira ficou por Luau e a segunda chegou ao Lobito; in: Jornal de Angola, de 23.Jul.2023, URL: https://www.jornaldeangola.ao/ao/noticias/comboio-da-rovos-rail-chega-ao-lobito-com-47-turistas/.

 *Investigador Colaborador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL (CEI-IUL) e Investigador-Associado do CINAMIL e Pós-Doutorado da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto**
** Todos os textos por mim escritos só me responsabilizam a mim e não às entidades a que estou agregado .

Sobre o autor

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