40 dias depois da tomada de posse de DonaldTrump como Presidente dos EUA, há sinais visíveis de grandes mudanças no panorama político internacional, na geoestratégia e na definição das zonas de influência.
Texto Vítor Norinha (Jornalista)
Fotos Arquivo FN
A mais recente informação sobre o restabelecimento de relações bilaterais normais entre EUA e a Federação Russa foi dada pelo Pentágono que ordenou uma pausa nas operações cibernéticas dos EUA contra a Rússia. A ordem foi dada pelo secretário da Defesa dos EUA, Pete Hegseth, que ordenou a pausa daquele tipo de operações, incluindo ações ofensivas. O New York Times refere que esta reavaliação das operações não tem uma duração claramente definida, mas apenas que foi dada uma ordem no final de fevereiro no sentido de o Comando Cibernético dos EUA suspendesse todas as ações digitais ofensivas. Estas instruções não se aplicam à Agência de Segurança Nacional a nível de Inteligência que visa a Rússia.
Acontece que esta pausa, neste tipo de operações cibernéticas, que não foram confirmadas oficialmente, acontecemnuma altura em queTrump se aproxima de Moscovo a propósito da guerra na Ucrânia, com o objetivo de normalizar relações diplomáticas e futuramente comerciais, e em que se fala da preparação da cimeira Trump/Putin que deverá ocorrer na Arábia Saudita. Os EUA atuam como mediador do conflito, sobrepondo-se à própria Ucrânia e aos supostos aliados europeus. Os EUA, através do secretário de Defesa já tinha afirmado em meados de fevereiro que a Europa não é a prioridade dos EUA e deve ser a Europa a fornecer a “esmagadora” ajuda a Kiev.
Por outro lado, antes da cimeira dos Presidente americano e russo, Washington tentou conduzir o presidente ucraniano Zelensky para um nível de cedência à Rússia que este afastou completamente. As imagens do encontro entre Trump e o Presidente ucraniano deixaram claro que Zelensky saiu humilhado do encontro na Sala Oval, tendo sido provocado sobretudo pelo vice-presidente JD Vance, e que tudo acabou por ser um espetáculo mediático transmitido em direto pelas televisões para todo o mundo e onde a má educação pontuou, incluindo o tema da roupa, tipo caqui limitar, que Zelensky usa desde que começou a guerra, algo semelhante ao que Churchill usou durante o conflito da II Guerra Mundial, quando se encontrou com o presidente norte-americano Roosevelt. Também o acordo de minerais que deveria ser assinado entre Ucrânia e EUA ficou em standby e, é bem provável que os EUA deixem de fornecer material militar à Ucrânia.
Zelensky foi aconselhado, quer pelo 1º ministro do Reino Unido, Keir Starmer, quer pelosecretário-geral da NATO, o neederlandês, Mark Rutte, a retomar as negociações com a Casa Branca e com a equipa de Trump. O Presidente ucraniano tem expresso gratidão pelo apoio dos EUA no conflito com a Rússia, mas essa gratidão acaba por cair inteiramente na gestão da administração de Joe Biden. Do lado da Europa, a Ucrânia continua a receber apoio, mas será muito difícil à Europa ter a capacidade de envolvimento que tem os EUA. Zelensky tem frisado que a Rússia é o agressor, mas, inesperadamente, nestes 40 dias de governação deTrump, este assumiu a narrativa de Moscovo e Kiev passar de agredido a agressor. Nesta retórica o Kremlin insiste que a Ucrânia não quer a paz e o Presidente ucraniano tem insistido que está disponível para uma paz presente e futura e quer garantias de uma paz duradoura e com integridade do território, sendo certo que está fora de causa a adesão à NATO devido à oposição da atual administração americana.
Aliás, nestes 40 dias tem havido declarações verdadeiramente surpreendentes de governantes americanos, caso de ElonMusk, o patrão da plataforma X, da empresa de automóveis Tesla e da companhia aeroespacial Space X, de que os EUAdeveriam sair da NATO e da Organizações das Nações Unidos, uma instituição que sucedeu à Sociedade das Nações depois do conflito da II Guerra Mundial, com o objetivo de sentar todos os países no mesmo fórum e discutir assuntos que poderiam gerar eventuais conflitos. Sem os EUA, nenhuma das organizações faria sentido.
A Europa que está disposta a ajudar a Ucrânia na defesa perante a Rússia está a sofrer pressões dos parceiros europeus que querem ser mediadores no conflito e não deixar o trabalho para ao EUA perante as persistentes desconfianças nas últimas semanas. Mas a pressão sobre a Ucrânia vem de todo o lado, com o ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Jean-Noel Barrot, a afirmar que há risco de a guerra alastrar a toda a Europa. Disse que “o riscode guerra no continente europeu nunca foi tão elevado porque, durante quase 15 anos, a ameaça continuou a aproximar-se de nós, a linha da frente continuou a aproximar-se de nós”, em declarações à rádio France Inter.
A mais recente ofensiva de Paris e Londres foi propor uma trégua de 1 mês na guerra dentro da Ucrânia, de forma a mitigar mais efeitos nocivos e a propagação do conflito a outras nações europeias. Macron defendeu o envio de tropas europeias para aa Ucrânia após a assinatura do tratado de paz, mas a Rússia já veio dizer que não quer militares europeus a defender a linha de fronteira e, portanto, próximo do seu território. O Presidente francês sublinhou no início de março, que quer paz, mas não a qualquer preço, ou seja, quer garantias de que a paz irá perdurar, algo semelhante ao que Zelensky tem defendido.
Por aquilo que se percebe é que as negociações vão implicar cedências de território ucraniano, a perda de importância da NATO, o perigo permanente de ataque aos países a leste da Europa, pois Putin mantém ambições expansionistas, e o recuo da Europa a nível de bem-estar da população e de crescimento económico, com o redireccionamento de investimentos em infraestruturas, em saúde ou educação para a defesa, com a construção de sistemas próprios. Reino Unido e França são os países com indústria militar e poder atómico que irão liderar o rearmamento europeu.
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